quarta-feira, 30 de dezembro de 2009

Microfonia

Ah, aquelas vozes!
Confundem-se umas com as outras,
elevam-se, impõe-se, oprimem.

E ali estava o quieto,
que um dia tentou falar,
mas diante de tanta arrogância,
preferiu mesmo o calar.

A sinfonia da insolência
continua a tocar.
Exibem as melodias autoritárias
de quem pode e quem não deve falar.

sábado, 5 de dezembro de 2009

3x4

Desde moleque colecionava fotos 3x4 de todas as pessoas que conhecia.
Aos trinta anos possuía aproximadamente sete mil e quinhentos retratos. Decidiu, então, juntar todas as fotos, desocupar o seu quarto e preenchê-lo completamente com todas as fotos.
Começou por uma das paredes. As fotos não seguiam nenhum tipo de ordem. Aleatoriamente, seu avô quando tinha setenta anos ficou ao lado de Gabriel, seu amigo da terceira série. Abaixo, estava sua quinta namorada Fabíola e o seu excêntrico moicano, seguida de tantas outras pessoas das mais variadas origens.
No teto estavam a sua mãe, com trinta e oito anos e algumas rugas à vista, Seu Orlando da padaria com a sua cara de sério alimentada pelos óculos na ponta do nariz e Matilde, a babá de sua irmã Melissa, que por sua vez estava próxima do rodapé com seus três aninhos e seus dois dentinhos.
Johnny, seu vizinho da Rua Almeida, fazia cara de assustado na parede oposta àquela onde estava o seu pai, com quarenta e sete anos e já grisalho. Teresa, aquela que pela primeira vez lhe encostou os lábios estava acima de Lindolfo, seu primo insuportável e seus treze anos. Tia Nise, da Primeira Série, sorria logo acima da cara carrancuda de seu tio-avô, Marcos.
O espaço em branco foi sumindo aos poucos e transformou-se num conjunto de pessoas olhando para ele. Estava no meio do quarto e agora era o centro das atenções de todas aquelas pessoas. Gargalhava como um alucinado, conquistava enfim a sua fama e todos lhe dirigiam olhares e sorrisos.

Durou cinco minutos. Então, percebeu a mediocridade de todas aquelas pessoas e seus olhares momentâneos e forçados, seguindo o padrão retangular 3x4. Assim, percebeu a sua própria decadência em desejar mais do que tudo, que todas aquelas pessoas medíocres um dia olhassem para ele, mais um medíocre gargalhando no centro do quarto.